
Leia na íntegra a entrevista concedida por José María Gasalla sobre liderança e autoconfiança para o Portal CANAL RH!
A autoconfiança é uma característica fundamental para um bom líder?
Sem dúvida a autoconfiança é importante, mas, no meu modo de ver, fundamental é o autoconhecimento, a capacidade de conhecer a si mesmo e aceitar suas forças e fraquezas. Penso que o autoconhecimento é a base a partir da qual se estrutura a autoconfiança. Como reconhecer o chamado líder superior (aquele que se empenha para que os demais confiem em si mesmos)?
O líder superior tem uma atitude de mestre e ao mesmo tempo de aprendiz. Ele tem satisfação em contribuir com o crescimento profissional de seus colaboradores, mas também de continuar aprendendo. Uma pessoa que tenha esses dois comportamentos em equilíbrio pode, sem dúvida, ser reconhecida como um líder superior.
É verdade que um líder autoconfiante consegue transmitir essa qualidade para os subordinados, sabe delegar e faz com que a equipe assuma responsabilidades, se comprometa com a empresa e se torne autogerenciável?
Veja, a autoconfiança por si só não basta para que um líder de equipe faça todas essas coisas. Há líderes que são sem dúvida muito autoconfiantes, porém não gostam de delegar nem incentivam a equipe a assumir responsabilidades. Eu diria que a autoconfiança é uma das condições primordiais para o exercício da liderança, mas não a única. Até a algum tempo, considerava-se como líder aquele que fazia com que os colaboradores o seguissem, compartilhando sua visão. Penso que esse conceito está ultrapassado, pois não se aplica à realidade e às necessidades das empresas hoje. Um conceito mais atualizado, em minha visão, é a do líder que cria condições para o desenvolvimento do potencial de seus colaboradores.
Um líder que não tem confiança em si mesmo e teme perder seu posto para um subordinado costuma ser controlador e toma para si todas as responsabilidades?
Bem, se a pessoa não tem autoconfiança, ela não é líder; é no máximo chefe, aquele que manda e pronto. A atitude que você descreve é típica de quem não sabe lidar com seus medos e se fecha para os demais, não permitindo que eles conheçam suas fraquezas. Muitas vezes isso acontece em decorrência da própria evolução na hierarquia da empresa, um fenômeno que chamamos de “princípio de Peter”. O educador canadense Laurence Peter dizia que os profissionais ascendem na organização até chegar ao nível de incompetência, em que já não se sentem tão seguros de si ante as responsabilidades que possuem – e aí surge a falta de autoconfiança, que os torna fechados e controladores.
Como um líder pode ganhar mais autoconfiança? E que efeitos essa melhora costuma ter no ambiente de trabalho?
O fato de uma pessoa exercer a liderança não significa que seja perfeita, completamente bem-resolvida e autoconfiante. Não creio que alguém consiga ser 100% seguro de si em um contexto no qual mudanças ocorrem com grande freqüência. O líder precisa fortalecer sua autoconfiança a cada momento, e uma das maneiras de fazer isso é enfrentar os desafios que surgem e assumir riscos, pois, conforme vai obtendo bons resultados, torna-se mais e mais autoconfiante. É também muito importante que ele permita que os colaboradores lhe dêem feedbacks abertos e francos, pois isso possibilita que o líder reflita sobre suas atitudes, saiba o que está dando certo e o que precisa melhorar. De fato, a autoconfiança do líder é muito fortalecida pela constatação que ele tem a confiança da equipe, e essa constatação ocorre por meio do feedback de cada colaborador.
Há pessoas que confundem autoconfiança com arrogância? Como evitar que isso aconteça e prejudique a equipe?
Certamente há pessoas que confundem as duas coisas. Porém, autoconfiança e arrogância são opostas, jamais poderiam coexistir. Geralmente o chefe muito arrogante, prepotente e duro com seus colaboradores age dessa maneira para não expor sua falta de autoconfiança, debilidades e medos. Em minha visão, há dois elementos-chave que acompanham a autoconfiança: humildade e a generosidade. Para que um líder possa atuar como mestre e aprendiz, como eu disse anteriormente, ele precisa ter humildade para reconhecer que tem muito a aprender e generosidade para ajudar seus colaboradores a se tornarem pessoas mais competentes, capazes e profissionais mais completos.
Que cenário é mais favorável para o desenvolvimento da autoconfiança? E o que costuma prejudica-lo?
É o que eu chamo de cenário aberto, em que se permite errar e reconhecer os erros, se permite expressar opiniões abertamente, em que não existe medo. Esse é o ambiente mais favorável ao desenvolvimento da confiança. Conseqüentemente, tudo que é contrário a essa abertura impede as pessoas de ser autoconfiantes. Há empresas em que os erros não são tolerados, muito menos admitidos; em que não se diz a verdade ou se omitem fatos que mostrem, por exemplo, que as coisas não vão bem. Isso tudo cria um clima de medo e desconfiança, muito desfavoráveis ao desenvolvimento da autoconfiança não só dos líderes, mas de todos os colaboradores.
Que modelo de gestão estimula a autoconfiança na equipe?
Desenvolvi um modelo que tem como objetivo favorecer a criação de um clima de confiança na organização, o que sem dúvida estimula o desenvolvimento de autoconfiança nas equipes de trabalho. Chamo-o de Gestão por Confiança (GpC), e ele se baseia em componentes organizacionais e individuais. Na parte organizacional, trabalhamos no sentido de obter coerência entre os componentes estratégicos, processos, cultura e políticas de gestão de pessoas. Se por exemplo os processos da empresa dependem fundamentalmente do trabalho em equipe, mas sua cultura é individualista, essa falta de coerência afeta a credibilidade da organização perante os colaboradores, dificultando a criação de confiança. No que diz respeito aos componentes individuais, o objetivo é estimular o desenvolvimento de atitudes e comportamentos, sobretudo dos líderes, que contribuem para a criação de um clima de confiança entre as pessoas. Aqui entram os componentes que chamo de 10cs: cumprimento, comprometimento, consciência e clareza (essas quatro verdadeiramente essenciais), mais competência, consistência, coerência, confidencialidade, cumplicidade e correspondência.
As mudanças na dinâmica do ambiente de trabalho podem prejudicar a autoconfiança? Como evitar que isso aconteça?
É preciso saber conviver com as freqüentes mudanças internas e externas às empresas, pois são inevitáveis. A vida é mudança, e o que não muda está cristalizado, estático, morto. As pessoas em geral acreditam que mudar traz riscos, quando o que ocorre é justamente o contrário: não mudar é que é perigoso, ainda mais em tempos como os atuais, em que tudo se transforma muito rapidamente. Para ajudar as pessoas a conviver com esse cenário, penso que é preciso destacar os benefícios que as mudanças trazem, sejam diretos ou indiretos, imediatos ou de médio e longo prazos. Ao mesmo tempo, pode-se destacar os perigos que não mudar representa.
Em termos de ganhos para a empresa, quanto a autoconfiança pode ser lucrativa? E quanto a falta da confiança pode causar prejuízo?
A confiança gera resultados econômicos indiretos e diretos. Um exemplo de resultados indiretos é que pessoas autoconfiantes não têm medo de expressar suas opiniões e idéias; isso favorece o afloramento de seus talentos e potenciais, o que traz benefícios para a produtividade e inovação da empresa. Como exemplo de resultados diretos, temos a diminuição dos custos relacionados aos mecanismos de controle da empresa. Onde há mais confiança, há menos necessidade de controle sobre as pessoas – controle de permanência, de acesso, de tempo, de qualidade e outros. Partindo-se do princípio que esses mecanismos representam uma parcela significativa dos custos administrativos de uma empresa, pode-se imaginar a economia que o incremento da confiança pode trazer para a organização... Isso mostra que a confiança traz não só benefícios de ordem psicológica ou sociológica, mas também de ordem econômico-financeira.
Podemos mensurar os lucros e custos relacionados à confiança de modo direto e indireto. Direto – a confiança substitui os medos e favorece o afloramento dos talentos e pontenciais das pessoas. Medos e falta de confiança encobrem esses talentos, isso eu sei que é indireto, não mensurável. Direto: confiança mais controle igual a controle. Isso significa que quanto mais confiança tem na organização, menos controle tem de ter, e os custos do controle representam uma boa parte dos custos administrativos: controle do tempo, controle de presença, de permanência, de qualidade... Todos esses custos podem diminuir com o incremento da confiança. por isso penso que tema da confiança tem interesse do ponto de vista psicológico e sociológico, mas também econômico.
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